[imagem: Schiele, 1910]

quarta-feira, 15 de junho de 2011

La conciencia de la mestiza / rumo a uma nova consciência (Gloria Anzaldúa)


Porque eu, uma mestiza,
continuamente saio de uma cultura
para outra,
porque eu estou em todas as culturas ao mesmo tempo,
alma entre dos mundos, tres, cuatro,
me zumba la cabeza con lo contradictorio.
Estoy norteada por todas las voces que me hablan
simultáneamente.

(...)

Em um estado constante de nepantilismo mental, uma palavra asteca que significa partido ao meio, la mestiza é um produto da transferência de valores culturais e espirituais de um grupo para outro. Ser tricultural, monolíngüe, bilíngüe, ou multilíngüe, falando um patois, e em um estado de transição constante, a mestiza se depara com o dilema das raças híbridas: a que coletividade pertence a filha de uma mãe de pele escura?


El choque de un alma atrapado entre el mundo del espíritu y el mundo de la técnica a veces la deja entullada. Nascida em uma cultura, posicionada entre duas culturas, estendendo-se sobre todas as três culturas e seus sistemas de valores, la mestiza enfrenta uma luta de carne, uma luta de fronteiras, uma guerra interior. Como todas as pessoas, percebemos a versão da realidade que nossa cultura comunica. Como outros/as que vivem em mais de uma cultura, recebemos mensagens múltiplas, muitas vezes contrárias. O encontro de duas estruturas referenciais 3 consistentes, mas geralmente incompatíveis, causa um choque, uma colisão cultural. 
(...)
Ao perceber informações e pontos de vista conflitantes, ela passa por uma submersão de suas fronteiras psicológicas. Descobre que não pode manter conceitos ou idéias dentro de limites rígidos. As fronteiras e os muros que devem manter idéias indesejáveis do lado de fora são hábitos e padrões de comportamento arraigados; esses hábitos e padrões são os inimigos internos. Rigidez significa morte. Apenas mantendo-se flexível é que ela consegue estender a psique horizontal e verticalmente. La mestiza tem que se mover constantemente para fora das formações cristalizadas do hábito; para fora do pensamento convergente, do raciocínio analítico que tende a usar a racionalidade em direção a um objetivo único (um modo ocidental), para um pensamento divergente, 4 caracterizado por um movimento que se afasta de padrões e objetivos estabelecidos, rumo a uma perspectiva mais ampla, que inclui em vez de excluir.

A nova mestiza enfrenta tudo isso desenvolvendo uma tolerância às contradições, uma tolerância às ambigüidades. Aprende a ser uma índia na cultura mexicana, a ser mexicana de um ponto de vista anglo-americano. Aprende a equilibrar as culturas. Tem uma personalidade plural, opera em um modo pluralístico nada é posto de lado, o bom, o ruim e o feio, nada é rejeitado, nada abandonado. Não apenas sustenta contradições como também transforma a ambivalência em uma outra coisa.
 (...)
O trabalho da consciência mestiza é o de desmontar a dualidade sujeitoobjeto que a mantém prisioneira, e o de mostrar na carne e através de imagens no seu trabalho como a dualidade pode ser transcendida. A resposta para o problema entre a raça branca e a de cor, entre homens e mulheres, reside na cicatrização da divisão que se origina nos próprios fundamentos de nossas vidas, nossa cultura, nossas línguas, nossos pensamentos. Extirpar de forma massiva qualquer pensamento dualista no indivíduo e na consciência coletiva representa o início de uma longa luta, que poderá, com a melhor das esperanças, trazer o fim do estupro, da violência, da guerra.
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 Capítulo do livro Borderlands/La Frontera: The New Mestiza, de Gloria Anzaldúa, originalmente publicado em 1987. Leia o texto na íntegra aqui.

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